sábado, 16 de agosto de 2025

Planícies de Inundação e a Alma Americana


Há um lugar na Califórnia onde os rios tentam lembrar aos homens que tudo flui. É o Vale do Sacramento, onde a Floodplain Forward Coalition trabalha para reconectar o que a pressa separou: águas e margens, peixes e pássaros, ciência e sobrevivência. Ali, a geografia não é apenas paisagem — é memória, é resistência, é promessa.

Enquanto isso, em outro canto da mesma nação, um homem nega tudo. Nega o clima, nega a ciência, nega a história. Ele ocupa o cargo mais alto, mas parece viver num porão ideológico, onde a luz não entra e o eco é a única companhia. Donald Trump, presidente de um país que já cantou o Blues, que já vagou pelas estradas com Kerouac, que já gritou contra a guerra com Dylan. O mesmo país que produziu a contracultura agora se vê refém de uma figura que é, paradoxalmente, produto dela.

É a singularidade americana: terra de planícies férteis e desertos morais. De coalizões ecológicas e muros simbólicos. De vozes que cantam a dor e outras que berram a negação.


A planície de inundação é metáfora perfeita. Quando o rio transborda, ele não destrói — ele fertiliza. Mas para isso, é preciso espaço, é preciso escuta. A coalizão entende isso. Trump, não. Ele é a cheia que não quer recuar, que quer ocupar tudo, endurecer o solo, impedir o fluxo.

E nós, observadores desse teatro geossistêmico, tentamos costurar sentido. Porque a geografia não é neutra. Ela é palco e personagem. Ela é onde a cultura se inscreve, onde a política se desenha, onde a identidade se revela.

No fim, talvez o Blues tenha razão: é preciso cantar a dor para não afundar nela. É preciso lembrar que até o rio, quando respeitado, sabe voltar ao leito. E que a planície, mesmo inundada, guarda em si a semente da regeneração.

https://www.linkedin.com/pulse/cheia-e-o-pr-luciano-f-d-s-paula-irlhf



Nenhum comentário:

Postar um comentário