quinta-feira, 6 de março de 2025

Um completo desconhecido: Jornada de Belchior a Bob Dylan

 






 Do Ceará a Minnesota: Uma Jornada Geográfica e Poética de Belchior a Bob Dylan

 

O Encontro com Belchior


Em meados de 2012/13, na Universidade Estadual do Ceará (UECE), eu, um estudante de Geografia Física, mergulhava em mapas, gráficos e teorias sobre a dinâmica da Terra. Meu mundo era feito de coordenadas, relevos e fenômenos climáticos. No entanto, em meio a essa busca pelo entendimento do mundo físico, encontrei algo que mudou minha percepção não apenas da geografia, mas da própria vida: a obra de Belchior.


Belchior, com sua voz rouca e suas letras repletas de angústia e beleza, foi minha primeira porta de entrada para um universo poético que eu mal sabia existir. Suas canções, como "Como Nossos Pais","A Palo Seco", "Conheco o meu Lugar" e "Monólogo das Grandezas do Brasil", falavam de um Brasil profundo, de sonhos despedaçados e da luta por autenticidade em um mundo cada vez mais padronizado. Para mim, Belchior era um farol, um guia que me ajudava a navegar pelas complexidades da existência humana. Mas, como descobri mais tarde, ele era apenas a ponta de um iceberg muito maior.



 O Aprendiz de Dylan


Ao me aprofundar na obra de Belchior, descobri que ele era, em muitos aspectos, um discípulo de Bob Dylan. Belchior não escondia sua admiração pelo artista norte-americano, e isso se refletia em sua música. A influência de Dylan estava presente na forma como Belchior construía suas narrativas, na maneira como ele misturava o pessoal com o universal, e na sua recusa em se conformar aos padrões da indústria musical.

Belchior, como Dylan, era um poeta que usava a música como veículo para suas reflexões existenciais e sociais. Ambos compartilhavam uma visão de mundo cética, mas profundamente humana. No entanto, enquanto Belchior era um artista profundamente enraizado no contexto brasileiro, Dylan transcendia fronteiras, tornando-se uma figura global. Foi então que percebi que Belchior era apenas um aprendiz de um mestre muito maior: Bob Dylan.



 O Paradoxo Vivo


Ao mergulhar na obra de Dylan, encontrei um artista que era, em essência, um paradoxo vivo. Dylan é um ícone cultural que rejeita o status de ícone, um artista profundamente pessoal que se esconde atrás de personagens e metáforas, e um homem que busca conexão humana enquanto mantém uma distância segura. Sua obra e sua persona são indissociáveis, cada uma alimentando e refletindo a outra.

Dylan é um mestre da reinvenção. Ao longo de sua carreira, ele passou por diversas fases: o folk singer engajado dos anos 1960, o roqueiro elétrico, o cantor country, o pregador gospel e o lendário "trovador" contemporâneo. Cada uma dessas fases representa não apenas uma mudança musical, mas uma transformação pessoal. Dylan nunca se contentou em ser apenas uma coisa; ele é um artista em constante evolução, sempre questionando a si mesmo e ao mundo ao seu redor.



A Geografia de Dylan: Um Mapa Poético


Como estudante de Geografia Física, não pude deixar de notar como a obra de Dylan reflete uma geografia poética. Suas músicas são como mapas que nos guiam através de paisagens emocionais e existenciais. Canções como "Blowin' in the Wind" e "The Times They Are A-Changin'" são cartografias de um mundo em transformação, enquanto "Tangled Up in Blue" e "Shelter from the Storm" nos levam a viagens introspectivas através das memórias e dos sentimentos do artista.


Dylan, como um geógrafo, mapeia não apenas o mundo exterior, mas também o interior. Suas letras são repletas de imagens que evocam lugares reais e imaginários, criando um senso de deslocamento e busca que ressoa profundamente com aqueles que, como eu, estão em uma jornada de autodescoberta.



A Jornada Continua


Minha jornada de Belchior a Dylan foi mais do que uma simples descoberta musical; foi uma exploração geográfica e poética do mundo e de mim mesmo. Belchior me mostrou a beleza e a dor de ser humano, enquanto Dylan me ensinou que a arte é uma forma de transcendência, uma maneira de questionar, reinventar e se conectar com o universo.


Hoje, como pesquisador e amante da música, vejo que tanto Belchior quanto Dylan são parte de um mesmo mapa — um mapa que nos guia através das complexidades da vida e da arte. E, assim como a geografia física nos ensina que a Terra está em constante transformação, Dylan nos lembra que nós também estamos sempre em fluxo, sempre em busca de novas paisagens, novas respostas e novas formas de ser.

No fim, tanto Belchior quanto Dylan são faróis que iluminam o caminho, mas é cada um de nós que deve percorrê-lo. E, nessa jornada, a música — como a geografia — é tanto uma bússola quanto um destino.




                                                                                                                        Luciano FDS Paula 

Nenhum comentário:

Postar um comentário